prédios históricos

Com quase 94 anos de existência, sede do Clube Caixeiral vira centro de disputa judicial

Gustavo Martinez

data-filename="retriever" style="width: 100%;">Foto: Pedro Piegas (Diário)

Desde o ano passado, o Diário acompanha a situação de prédios históricos da cidade que, hoje, encontram-se abandonados ou deteriorados. Parte importante da memória de Santa Maria, a reportagem chama a atenção para o estado dessas edificações. Nesta edição, os conturbados últimos quatro anos do Clube Caixeiral Santamariense são explorados, tanto a questão estrutural quanto uma ação judicial que tem o prédio como elemento central são discutidos. Localizado no Centro da Cidade, entre o Calçadão Salvador Isaia e a Rua Alberto Pasqualini, a sede do Clube, aberta em 1926, está fechada desde 2018.

Prestes a completar 94 anos de existência, o prédio do Clube Caixeiral Santamariense virou disputa judicial entre a prefeitura e a diretoria da entidade. O telhado da sede do grupo desabou em fevereiro de 2018 e, de lá pra cá, o futuro do prédio está incerto (veja o histórico completo abaixo).

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Em 28 de julho do ano passado, o Executivo municipal entrou com uma ação na Justiça com cinco demandas para o clube: que realizasse a imediata retirada do telhado original restante do imóvel; realizasse a substituição do telhado original; apresentasse laudo técnico para certificação da estabilidade estrutural do restante do prédio; procedesse o desligamento da energia elétrica e da água no imóvel; e efetuasse a retirada de objetos de valor artístico que estiverem no interior do prédio.

A procuradora-geral do município, Mirela Marquezan, explica por que a ação foi iniciada:

- Basicamente por que a gente tomou ciência de uma situação de insegurança no prédio do Caixeiral. Com o passar dos anos, foi se tornando cada vez mais grave a situação, cada vez mais perigosa. Até mesmo o Ministério Público começou a nos enviar ofícios nos provocando sobre aquela situação - relatou Mirela.

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Foto: Pedro Piegas (Diário)
A atual situação da parte interna do Clube

A Justiça decidiu favoravelmente à prefeitura no dia 30 de julho do ano passado, com prazo de 10 dias para que o clube atendesse aos pedidos. Do contrário, a entidade seria multada em R$ 100 por dia, limitado a até 30 dias, com uma multa máxima de R$ 3 mil.

Contudo, a Justiça só conseguiu notificar o Clube em 20 de outubro de 2021, quase três meses depois.

No dia 10 de janeiro deste ano, a prefeitura entrou com uma nova petição, exigindo a majoração da multa - ou seja, o aumento do valor - para R$ 5 mil por dia por até 30 dias, com a possibilidade de serem cobrados até R$ 150 mil em caso de descumprimento. A Justiça ainda não se manifestou a respeito da petição.

De acordo com a prefeitura, até o momento, a única das exigências cumpridas foi o desligamento da eletricidade e da água do prédio, mas por meio de uma liminar pedida pelo próprio Poder Público e concedida pela Justiça, e não pela ação da entidade.

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O presidente do Clube Caixeiral, Lauri Pötter, disse não estar ciente sobre nenhuma ação da prefeitura contra a entidade.

- Não recebi nada sobre isso - disse Pötter, ao ser perguntado sobre a ação.

Contudo, a procuradora-geral afirma que conversou pessoalmente com ele, ainda em janeiro, sobre a situação. Antes disso, porém, documentos do Ministério Público demonstram que Lauri confirmou por telefone - no mesmo número que a reportagem entrou em contato com ele - a uma oficial de justiça que recebeu a intimação.

- E o que eu pensei a partir dessa reunião: bom, vamos majorar a multa, se Deus quiser, seguindo a lei, o juiz vai dar uma multa mais alta, não sei de quanto, e a partir daí vou ter um valor considerável e indicar o clube a penhora e a partir daí tomar medidas mais efetivas - explica a procuradora sobre a motivação do pedido de majoração.

Conforme Mirela, foi observado uma inércia por parte do Clube, e a penhora permitiria que o Poder Público tomasse medidas a respeito da condição estrutural em que se encontra o prédio.

- Hoje, ele é particular, tem uma diretoria, tem um presidente, e a gente só ouve notícias de pretensão de venda, não chega nada formal para nós - relata Mirela, sobre a impossibilidade de uma ação direta da prefeitura no momento.

style="width: 100%;" data-filename="retriever">Foto: Renan Mattos (Arquivo Diário)
Em maio de 2019, o Diário teve acesso à parte interna do Clube

VENDA

Em abril deste ano, um novo capítulo na história do Clube Caixeiral começou. Agora, a saída encontrada pela diretoria foi a venda do prédio.

A reportagem do Diário apurou que existiam pelo menos duas empresas interessadas em comprar a área, que teve duas avaliações feitas por imobiliárias da cidade. Uma delas teria estimado que o prédio e o terreno valem R$ 12 milhões, enquanto a outra teria avaliado em R$ 15 milhões.

O dinheiro arrecadado seria utilizado para a compra de um novo terreno e construção de uma nova sede.

A assembléia que decidiria se o prédio poderia ser vendido foi marcada para o dia 10 de maio de 2021, mas, na data, os associados presentes pediram mais tempo para analisar a situação. Em 23 de agosto,  em uma nova assembléia, a venda foi aprovada.

Em 18 de novembro, mais uma assembléia foi convocada, dessa vez para analisar proposta de um grupo de empresários de Porto Alegre, que construiriam um novo prédio para a associação em troca da estrutura atual.

style="width: 100%;" data-filename="retriever">Foto: Pedro Piegas (Diário)
As portas ainda servem como um vislumbre do passado luxuoso do Clube

A proposta nem chegou a ser lida porque um dos associados alegou que, conforme o estatuto, para haver votação válida seria preciso ter 50 associados presentes. Como havia cerca de 15 pessoas na reunião, outra assembleia terá de ser marcada.

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Segundo Pötter, nos próximos dias deverá ter início uma movimentação para acionar os associados e marcar a data de uma nova assembléia.

- Ter 50 associados, tem. O problema é reunir - diagnosticou Pötter.

Ele diz que estudam a possibilidade, permitida pelo estatuto, de emitir procurações para os associados. Dessa forma, um representante poderia votar no lugar de um sócio, facilitando a criação do quórum para a votação.

A oferta do grupo de Porto Alegre ainda esta de pé, afirma Pötter. Porém, se o prédio será vendido ou se será permutado por área construída, é ponto a ser definido pela votação em assembléia.

HISTÓRICO

Os problemas estruturais do Caixeiral podem ser remontados ao ano de 2013, quando o salão principal foi fechado, logo após a tragédia da boate Kiss. Em 2015, o então presidente do clube, Delmar Guerra, afirmou que cerca de R$ 200 mil já haviam sido investidos para adequar o salão às leis de prevenção a incêndios.

Em 6 de fevereiro de 2018, durante a madrugada, parte do telhado do Clube Caixeiral cedeu. Cerca de 30% da estrutura foi ao chão. De acordo com a prefeitura, na época, os alvarás e demais documentos necessários para o funcionamento do prédio estavam em dia. Não houveram mortos ou feridos na ocasião. O Restaurante Caixeiral, que funcionou no local durante 35 anos e é considerado o primeiro bufê da cidade, ficou inativo após a queda.

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No dia 19 de fevereiro daquele ano, um laudo revelou a causa do desabamento: parte da madeira que formava a estrutura do telhado estava apodrecida por conta de infiltração de água. O mesmo laudo apontou a necessidade de remoção do restante do telhado e construção de uma nova estrutura. À época, a presidência do clube falou que levantar os recursos necessários seria difícil.

style="width: 100%;" data-filename="retriever">Foto: Charles Guerra (Arquivo Diário)
A situação do telhado logo após a queda em 2018. Posteriormente, os escombros foram retirados.

No início de março, o arquiteto Marcus Coden, que atendia o clube, comentou os trâmites necessários para iniciar a obra.

- São dois processos que aguardamos. O pedido de licença para a remoção do telhado, que já está tramitando na prefeitura, e o pedido de diretrizes encaminhado ao Instituto de Planejamento. Isso é importante, pois se trata de um prédio de interesse patrimonial, e precisamos definir os materiais que serão utilizados - explicou o arquiteto.

Em 14 de março, o Restaurante Caixeiral demitiu todos os seus 14 funcionários. O dono afirmou que precisou fazer um empréstimo para quitar a rescisão de todos os empregados.

O projeto de recuperação do telhado foi entregue ao Instituto de Planejamento de Santa Maria (Iplan) no dia 26 de junho de 2018. 

- O Caixeiral fica em um local crítico, do ponto de vista do trânsito, com difícil acesso, o que poderia gerar um impacto gigantesco na circulação de carros, ocasionando congestionamentos nos locais próximos. Por isso, após estudos, reavaliações e revisões, foi entregue aos responsáveis (Iplan) um documento a fim de viabilizar a reforma o quanto antes e dentro das condições financeiras viáveis ao orçamento do clube - explicou Coden para o Diário, na época.

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Em 29 de novembro de 2018, o Iplan já havia aprovado o projeto, porém a direção do clube tinha como meta reabrir somente em 2019. A presidência do clube afirmou que já haviam três empresas interessadas na obra, e que a entidade estudava a possibilidade de patrocinadores pagarem a reforma.

- Estamos em fase de cotação de preço para ver quem vai executar a obra. Depois, precisamos definir como captar a verba. Creio que, dentro dos próximos 10 dias, teremos a definição da empresa e, quem sabe, já assinamos o contrato. Daí temos que partir para decidir como vamos financiar - afirmou à época para o Diário Lauri Pötter.

Ao final de maio de 2019, as reformas ainda não tinham começado. O custo total do serviço estava previsto na casa dos R$ 500 mil, e uma nova parceria poderia viabilizar todo o processo. O empresário Nilvo José Dorneles - que já foi proprietário da boate Ballare - procurou a direção e sugeriu arcar com a reforma de todo o Caxeiral, tanto o telhado quanto o restaurante que, a essa altura, já estava com o piso destruído pela chuva. Em troca, no local, o empresário abriria uma boate e um novo restaurante.

Em outubro de 2019, a diretoria do clube aprovou a concessão de uso por 20 anos para dois empresários, incluindo Dorneles, que ficariam responsáveis pela reforma da estrutura. A ideia é que durante o dia o clube voltasse a funcionar como um restaurante e, nos finais de semana, abrigasse uma boate. O plano era que tudo ficasse pronto em 2020.

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Contudo, uma ação judicial movida por Luis Henrique Pascotini, dono do restaurante Caixeiral, que ainda era locatário do local, embargou as negociações. Segundo ele, o Clube não ofereceu nenhum auxílio financeiro após o fechamento do empreendimento.

- Sempre paguei o aluguel em dia, e, no fim, tive que conseguir um empréstimo bancário para arcar com tudo que perdi. Espero receber uma indenização justa por isso - explicou Pascotini à reportagem do Diário à época.

Em janeiro de 2021, mais um pedaço do telhado cedeu. O acontecido não deixou feridos, mas serviu de alerta para a Defesa Civil, que isolou a lateral e a frente do Clube.

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Foto: Renan Mattos (Arquivo Diário)

O resultado da segunda queda do telhado, em 2021

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